terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Aumento do uso do preservativo

Diminuição da violência escolar e aumento do uso do preservativo
Sara R. Oliveira | 2010-12-17

O estudo Health Behaviour in School aged Children, da Organização Mundial de Saúde, revela que, em Portugal, as raparigas apresentam uma maior preocupação preventiva face aos riscos associados à sexualidade e os rapazes uma maior aceitação do risco. Investigação demonstra ainda que 76,5% dos alunos gostam da escola, mas 12,3% dizem sentir muito stress associado aos trabalhos escolares.

O HBSC/OMS - Health Behaviour in School aged Children é um estudo da Organização Mundial de Saúde e que em Portugal é realizado pela equipa do Aventura Social da Faculdade de Motricidade Humana e Centro da Malária e Doenças Tropicais desde 1994. De quatro em quatro anos, estudam-se os estilos de vida dos adolescentes do 6.º, 8.º e 10.º anos de escolaridade, com uma idade média de 14 anos de ambos os sexos, os seus comportamentos e problemas nos vários cenários da vida e analisa-se a evolução em 44 países da Europa e da América do Norte.

Em Portugal, a amostra foi constituída por 52,3% de raparigas e 47,7% de rapazes. No estudo de 2010, as meninas continuam a apresentar mais comportamentos de internalização e os rapazes mais comportamentos de externalização - um padrão que se mantém desde 1998. O que também não mudou foi o facto de os alunos mais velhos, do 10.º ano, apresentarem mais comportamentos de risco e menos comportamentos de protecção como, por exemplo, uma boa comunicação com os pais. Em alguns comportamentos associados à saúde, verificou-se que há um pico de risco no 8.º ano.

Os resultados são, regra geral, animadores. "Todas as medidas de prevenção universal nas escolas e na relação das escolas com as famílias e unidades de saúde têm efectivamente tido um efeito. O que há agora a fazer é tornar estas medidas continuadas e sustentadas, senão será fácil voltar atrás", afirma, ao EDUCARE.PT, a investigadora Margarida Gaspar de Matos, coordenadora geral do estudo realizado em Portugal. A responsável teme que haja um retrocesso nas medidas quando elas começam a dar frutos.

"Defendemos que a acção promotora de saúde deve começar logo nos primeiros anos da escola, mas com a nossa acção na universidade estamos, por um lado, a intervir junto dos jovens que chegaram até aqui sem ter sido alvo de acções de promoção de saúde e, por outro lado, a trabalhar com os pais de amanhã", acrescenta.

A maioria dos alunos inquiridos assegura que continua a gostar da escola, 76,5% em 2010, mas 12,3% dizem sentir muito stress associado aos trabalhos escolares. Na percepção da competência escolar, 8,9% consideram-se muito acima da média e 5,8% abaixo. No geral, os alunos sentem-se felizes, 84,2% em 2010, mas 8,5% revelam dificuldades em adormecer todos os dias, nomeadamente devido a tristeza, irritação ou dores de cabeça, estômago, costas ou pescoço.

Em 2010, 2,7% dos adolescentes afirmaram ter sido provocados na escola duas ou mais vezes por semana nos últimos dois meses anteriores ao estudo - o que representa uma descida significativa quando em 2006 essa percentagem era de 4,6%. Em 2002, foi o ano de maior envolvimento dos alunos em provocações enquanto vítimas. A maioria não tomou parte em provocações na escola, mas a percentagem dos que confessam ter provocado duas ou mais vezes por semana, nos últimos dois meses, subiu de 3% para 4,6% em 2010.

Aumento ligeiro no consumo de drogas
A maioria dos jovens portugueses refere que não consumiu drogas no último mês anterior ao inquérito. No entanto, o número que declara não ter consumido nenhuma vez desceu de 97,5% para 93,4% de 1998 para 2002, não se registando alterações desde então. E o consumo regular passou de 1,1% em 2006 para 1,4% em 2010. Desde 1998 que a experimentação de haxixe entre os jovens portugueses tem variado: 9,2% em 2002, 8,2% em 2006 e 8,8% em 2010. Nas restantes drogas consideradas, registou-se uma subida de 2006 para 2010: 1,8% para 2% no LSD, 1,6% para 1,9% na cocaína e 1,6% para 1,8% no ecstasy. Os nichos residuais, quer em termos de consumos como de violência, confirmam a importância das medidas de prevenção. Dados preocupantes? "Não me parece preocupante pelo aumento em si, que é minúsculo, mas sim pela regularidade desse aumento em todos os produtos e em geral. O Instituto da Droga e da Toxicodependência tem feito um trabalho notável nos últimos anos, que já valeu a Portugal um prémio internacional de boas práticas", responde Margarida Gaspar de Matos.

A grande maioria dos adolescentes confessa que não fuma, numa percentagem que tem vindo a aumentar, de 81,4% em 2002 para 88% este ano. Em 2010, 4,5% fumam diariamente. Também no consumo de bebidas destiladas tem havido uma descida: em 2010 apenas 0,3% confirmou este hábito. E os que o fazem diariamente desceram de 0,7% para 0,3%. A percentagem dos inquiridos que afirma nunca se ter embriagado subiu para 75,1%, mantendo-se em 6% os que referem que já se embebedaram quatro ou mais vezes.

Nas perguntas sobre relações sexuais, nos alunos do 8.º e 10.º anos verifica-se uma ligeira descida na percentagem dos jovens que dizem já ter praticado sexo. A percentagem de estudantes do 6.º ano que já tiveram relações sexuais desceu de 18,2% em 2006 para 16,9% em 2010. E desde 2002 que o uso do preservativo vem aumentando entre os jovens portugueses, ou seja, de 71,8% para 82,5%. Em 2010, 12% assumem ter tido relações sexuais associadas a consumo de álcool ou drogas.

Os anos passam e verifica-se que, cada vez mais, os jovens têm mais à-vontade para falarem de sexualidade com os colegas, pais e professores. No entanto, e apesar de haver mais adolescentes a usarem preservativo, constata-se que há menos conhecimentos nesta matéria, o que indica a necessidade de uma intervenção precoce. "É preciso acabar de vez com o preconceito de que a educação sexual provoca o início precoce das relações sexuais. Todos os estudos provam o contrário", defende a coordenadora do estudo. "Se os pais e professores não discutem com os jovens estes temas ligados à sexualidade, na sua vertente saúde, afecto e cultura, eles não vão ficar na ignorância nem na aceitação da velha rábula das 'florzinhas': falam uns com os outros, vão à Internet e não há aferição da qualidade da informação".

Em 2006, 35,8% dos adolescentes passavam mais de quatro horas em frente à televisão, número que diminuiu para 25,2% em 2010. O que aumentou foi o número de adolescentes que usam o computador mais de quatro anos por dia: 14,9% em 2006 e 16,8% em 2010. E os que nunca usavam computador desceu de 29,5% para 11,9%.

A maioria mantém o hábito de tomar o pequeno-almoço todos os dias, numa percentagem de cerca de 80% e mais de metade confessa que não está a fazer dieta. A maioria escova os dentes duas ou mais vezes por dia. Quanto ao exercício físico, cerca de metade pratica actividade três vezes ou mais por semana. A percentagem de adolescentes que nunca se envolveram em lutas tem vindo a diminuir, embora este ano se tenha registado a maior de sempre (71,6%) - e 94,9% garantiram nunca ter andado com armas no último mês.

Sexo a partir dos 16 anos
O estudo HBSC/OMS estendeu-se aos alunos do ensino superior português relativamente ao tema da saúde sexual e reprodutiva. Nesse sentido, foram inquiridos 3278 estudantes universitários, com idades compreendidas entre os 18 e os 35 anos, 30% do sexo masculino. Depois dos inquéritos, concluiu-se que 83,3% dos jovens já tiveram relações sexuais e começaram a sua vida sexual a partir dos 16 anos. Na primeira relação, 95,8% usou preservativo. Cerca de 40% dos estudantes têm uma relação amorosa há mais de dois anos e 84% mantêm uma relação sexual com o actual parceiro.

Os homens afirmam mais frequentemente terem relações sexuais e têm um relacionamento amoroso mais recente. São também os homens que mais referem ter tido, pelo menos uma vez, relações sexuais associadas ao álcool (53,1%), parceiros ocasionais (57,4%), relações sexuais com outra pessoa para além do parceiro (16,6%) e relações sexuais associadas às drogas (10,7%). No estudo, verificou-se ainda que 4% afirmou ter engravidado sem desejar, 3% ter efectuado uma interrupção voluntária da gravidez e 3% ter tido uma infecção sexualmente transmissível.

As jovens mulheres apresentam uma maior preocupação preventiva face aos riscos associados à sexualidade e os jovens homens uma maior aceitação do risco. De qualquer forma, e sobre os conhecimentos sobre a pílula, preservativo e comportamentos seguros ou de risco, a maioria escolheu a opção correcta, mas são as mulheres que têm conhecimentos mais correctos. A maior parte revelou sentir-se confortável ao comprar preservativos.

Uma investigação apurada, dados revelados. O que fazer? Qual o caminho a seguir? "A aposta é a continuidade, depois de todo o esforço que tem sido posto nos últimos anos na saúde dos jovens nas escolas e na investigação sobre a saúde dos jovens que fazemos nas universidades. O meu maior receio é que as coisas esmoreçam e não tenham continuidade." "O retrocesso é possível...", avisa a responsável pelo estudo realizado em Portugal.

Margarida Gaspar de Matos ficou satisfeita com o aumento da escolaridade dos pais dos jovens inquiridos - aumento significativo em quatro anos -, com a diminuição da violência, com o aumento do uso do preservativo. E ficou preocupada com o padrão de aumento das drogas. Nas questões analisadas pelo estudo da OMS, Portugal situa-se na média europeia. "Em 2006, estávamos verdadeiramente na média europeia, com uma ligeira vantagem nas questões da alimentação e uma desvantagem nas questões relacionadas com a escola e a competência escolar", recorda a coordenadora, acrescentando que o nosso país, no âmbito de um relatório da UNICEF para países da OCDE e recorrendo aos dados do HBSC, recentemente divulgado, apareceu como um dos três países - juntamente com a Áustria e a Holanda - em que há menos iniquidades de saúde. "O que quer dizer que de um grupo de sintomas físicos e psicológicos, estes três países foram os que os jovens mais pobres e menos pobres apresentavam menos este estatuto económico associado à percepção de saúde". "Fiquei contente, não é todos os dias que vemos uma distinção assim", comenta.

"A saúde dos jovens estará bem quando tudo correr sobre rodas inserido numa cultura familiar, escolar e de saúde e da prática autárquica." Mais do que as carências económicas, a investigadora portuguesa garante que há outros problemas no país relativamente à área em que se movimenta. "Como uma falta de gestão do desperdício e isto inclui coisas que se repetem, áreas de 'sobre-intervenção', enquanto outras são deixadas cair; intervenções que começam do zero, sem uma avaliação e continuidade do que foi feito antes", especifica.

Informações:
www.hbsc.org

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